Um ano muito interessante para a venda em ficção literária, a lista dos 10 mais vendidos do ano em ficção temos 4 livros clássicos e um livro de autor brasileiro em segundo lugar! Há muita confusão em torno da classificação de Torto Arado de Itamar Vieira Junior; a obra do brasileiro Itamar narra a história de vida dos trabalhadores rurais de Água Negra, uma fazenda na região da Chapada Diamantina, interior da Bahia, que não recebiam salários, apenas o direito de construir casebres e cultivar hortas nas terras. Todos eram descentes de negros, que foram escravizados. Contudo, para eles, a abolição da escravatura se deu apenas no papel. Embora tenha alcançado números espetaculares e invejáveis não foi o livro de ficção mais vendido como muitas listas o colocaram, sendo essa posição ocupada pelo livro A Garota do Lago, um suspense que pra mim não tem nada demais. Vamos dar uma olhada na lista e seus números e falar um pouco de cada livro. Listas são sempre interessantes e a lista dos mais vendidos de ficção do ano de 2021 está incrível e controvérsia em partes.
1. A garota do lago Charlie Donlea; Faro Editorial exemplares 196.231
A Garota do Lago não é um grande suspense, é um livro normal de suspense, bem amarradinho, mas para mim previsível também. Charlie Donlea consegue escrever algo com uma fórmula na mão e fazer um livro que flui, mas não fica nada do livro após 1 dia da leitura. Se lê com facilidade chega-se ao final sem muito cansaço e temos um final que para mim não surpreendeu nem um pouco. Mas a verdade é que o livro pegou no Brasil; vejo esse mérito como a magia do boca a boca, o marketing da Editora Faro foi muito eficiente e também o fato de ser uma narrativa que flui que embora apenas bem normalzinha não chega a ser cansativa e alcançou um grande público não tão exigente em literatura, um público que gosta de livros bem arrumadinhos em fórmulas já testadas.
Por que vendeu tanto? Fórmula já muito testada, narrativa simples que fluí, bem amarradinho. Marketing muito bem feito. Um livro que poderia nem estar entre os 20 e seria bem mais normal que ser o mais vendido por tão longo período no Brasil.
2. Torto Arado Itamar Vieira Junior; Todavia
exemplares: 188.933
Para mim é como ver a Copa do Mundo quando time mais fraco desbanca o mais forte. (No caso do mercado editorial é irônico, pois o mais forte em linguagem, em técnica tende a ter menos números em vendas) Sei lá, é a analogia que encontrei por sentimento para falar o quanto fico animado por ver um livro de literatura, com linguagem, com elementos dramáticos que nos encantaram em nossa jornada de formação como leitor, vendendo tanto assim. E é do Brasil!! O segundo lugar que deveria estar em primeiro sem dúvida, perdeu por muito pouco para um livro de viés totalmente comercial e que procura leitores sem muita exigência ou bagagem de leitura em bons textos. Sabemos que historicamente livros assim vendem mais. Torto Arado estar em segundo na lista dos livros de ficção mais vendidos do ano de 2021 é um resultado animador, próspero pois achamos muitas vezes que bons livros nacionais já estão instituídos como livros que vendem pouco para nichos minúsculos e que não podem fazer mais parte das grandes listas, ou da lista geral do Brasil como é o caso dessa que estamos revelando. Muitos pensam que o tempo de bons livros de ficção nacional ranqueando entre os primeiros lugares ficou no passado, livros com linguagem e qualidade do que compreendemos como boa literatura, quando tínhamos canônes como Jorge Amado, mas a realidade sempre nos traz esperança. E aí está a realidade nos surpreendendo num tempo de tantas frivolidades, um livro de boa literatura, passado no miserável sertão bahiano, em segundo lugar da lista nacional!
Por que vendeu tanto? A qualidade literária é ainda respeitada e amada por muitos. A dureza do sertão se mostrou um tema que sempre volta à tona e tem muitos interessados em nosso enorme país. O trabalho de compartilhamento nas redes, a animação de leitores engajados e felizes por ver um livro nacional de qualidade motivaram muito o marketing orgânico, o velho boca a boca, mas agora feito com o grande alcance e poder de influência das redes sociais.
3. A revolução dos bicho George Orwell; Várias Editoras exemplares: 171.891
Li um artigo que falava que o titulo usado mais recentemente é um spoiler, e é verdade mas deixamos assim pois é o titulo que conta da pesquisa. Mas podemos chamá-lo de A Fazenda dos Animais. Desde seu lançamento em 1945 o livro nunca deixou de ser um sucesso. E desde seu lançamento vendeu milhões. No Brasil não é diferente, aqui o livro sempre vendeu, anos mais anos menos ele sempre teve vendas admiráveis, mas nem sempre entrava na lista dos dez mais de ficção. O que contribuiu fortemente para essa posição elevada na lista e um incrível terceiro lugar com 171.891 exemplares vendidos foram os direitos as obras de Geroge Orwell terem caído em domínio público por aqui. Como se vê no titulo a informação de Editora são várias, pois ouve uma corrida de muitas edições por editoras de todos tamanhos pelo Brasil afora.
Por que vendeu tanto? O romance satírico do inglês George Orwell sempre vendeu e não tem previsão de parar de repente, pois trata de temas que não envelhecem em questões políticas e da natureza humana. Esse terceiro lugar no Brasil se deve ao enorme número de edições por editoras de todos os portes visto que os direitos da obra caíram em domínio público, ou seja, ninguém tem que pagar direitos autorais pela obra e qualquer cidadão pode fazer sua publicação da obra.
4. Os Sete maridos de Evelyn Hugo; Taylor Jenkins Reid; Paralela: exemplares 160.039
Esse é outro caso de hype, mas o mais incrível é que o livro cresceu muito mais que os outros em poucos meses. Só depois de julho o livro começou despontar, ou seja, ele teve menos de 6 meses para se posicionar entre os 4 mais vendidos livros de ficção em 2021 no Brasil.
A protagonista principal, Evelyn Hugo, foi uma das maiores estrelas do cinema de sua época e agora, prestes a completar 80 anos, está reclusa e vive sozinha em seu apartamento em Nova York. Surpreendentemente, Hugo decide contar toda a sua história, mas com uma condição, que seja para a inexperiente jornalista Monique Grant.
Mesmo sem entender as motivações de Evelyn, Monique aceita o desafio e mergulha de cabeça em mais de 40 anos de histórias de Hollywood por trás das câmeras e maquiagens. E haja verdade a ser contada!
A pergunta “Quem foi o grande amor da vida de Evelyn Hugo” é o fio narrativo da história, que amarra os sete casamentos da estrela e todas as decisões que ela tomou na vida. São exatamente essas escolhas, e o fato de Evelyn não se desculpar por nenhuma delas, que tornam a personagem tão verdadeira.
O livro teve um grande hype e uma das coisas comuns nos comentários dos leitores é a surpresa de uma narrativa que não te deixa largar os livros. Em muitos comentários os leitores dizem que leram o livro com muita rapidez por ser envolvente. Alguns leitores leram em um dia. E o livro não é fininho não, são 352 páginas.
Por que vendeu tanto? A narrativa embora pura ficção deu a impressão de uma história real. A personagem muito convincente e realista trouxe muitas respostas como uma atriz poderosa conversando com pessoas comuns. O entusiasmo dos leitores e seus comentários na rede ajudaram muito a escalada do livro.
5. 1984 de George Orwell ; várias editoras: 156.997
Fala sério Orwell está com tudo, dois livros na lista de mais vendidos de ficção no Brasil + o Big Brother com alta audiência... (embora ninguém que assista tenha lido Orwell) Brincadeiras à parte, desculpe Orwell, você não merece estar vinculado a tanta imbecilidade. Temos um número incrível de vendas e curiosamente 1984 está atrás duas posições de A Revolução dos Bichos que foi um livro que ficou um pouco ofuscado mundialmente pelo sucesso de 1984, mas que nunca deixou de ser um sucesso de vendas por isso. Mas no Brasil, ao menos nos últimos tempos A Revolução dos Bichos vende mais. Geroge Orwell causa assombro e admiração e essa maravilhosa presença otimista sobre a leitura no país, pois os números não mentem, ano após ano esses livros vendem aos milhares por aqui. Literatura de qualidade. E George Orwell leva a medalha de autor mais vendido no Brasil em 2021 somando todos os gêneros, não só ficção! Somando o total de 328.888 exemplares com os dois livros! George Orwell reina absoluto como escritor mais vendido no Brasil em 2021. E nada disso tem a ver com o Big Brother e o circo das imbecilidades...
Por Que vendeu tanto? George Orwell vem se mostrando um caso consistente de vendas nos últimos anos, mas a obra caindo em domínio público trouxe muitas edições e com isso um volume maior de oferta e divulgação da obra.
6. Teto para dois Beth O`Leary Intrínseca
exemplares: 93.806
Teto para dois é uma comédia romântica lançada pela Editora Intrínseca. Escrita por Beth O'Leary, a história fala sobre encontros inesperados e abre espaço para discussões sobre relacionamentos abusivos e crescimento pessoal.
É um Young adulto que traz uma mensagem, uma denúncia, mas é um livro bem leve e com tom feminino e de leitura fácil.
Na trama, Tiffy precisa de um novo apartamento - o namorado terminou com ela abruptamente, mais uma vez, e aparentemente em definitivo. Eis que ela encontra o anúncio de locação de um apartamento bastante peculiar: a locação é da cama, na verdade. O dono do lugar, Leon, precisa de dinheiro, e está alugando um lado para alguém dormir durante a noite - já que ele trabalha nesse horário - a fim de juntar a grana.
Tiffy aceita, e é a partir daí que uma relação inesperada surge. Através de post its e então encontros pra lá de engraçados, Leon e Tiffy se aproximam e encontram um no outro um companheirismo maravilhoso. Tudo isso enquanto Leon lida com assuntos pessoais relacionados à prisão do irmão e Tiffy, com o ex-namorado que não parece querer deixá-la em paz.
Por que vendeu tanto? Leitura fácil e cativante que traz uma denúncia muito atual de relacionamentos abusivos.
7. É assim que acaba Colleen Hoover Editora Galera exemplares: 71.347
Colleen Hoover é autora de romances e ficção para jovens adultos. Ela publicou seu primeiro romance, Slammed, em janeiro de 2012. Em dezembro de 2012, publicou Hopeless, que chegou ao topo da lista de mais vendidos do New York Times. Ela já publicou muitos romances por aqui. O engraçado desse gênero é que se mostrarmos Crime e Castigo para alguma leitora ela pode dizer que isso não se trata de um romance. Ao menos não como ela identifica um romance. Romance para autoras como Hoover e suas leitoras tem a ver com relação amorosa e seus dramas, nada a ver com estrutura. Livros para jovens adultos com todas arestinhas acertadas, eu diria que se trata de entretenimento para paixões rasas.
Por que vendeu tanto? Histórias do coração a resposta é simples isso vende aqui e muitos outros países. Sabe dizer por é O Amor de Zezé Di Camargo e Luciano vendeu tanto? Resoluções fáceis para o coração. Nem todo mundo quer complicações para entender o mundo...
8. O Duque e eu Julia Quinn Editora Arqueiro exemplares:71.347
A minha única animação de ver esses livros aqui é a de que eles estão atrás de bons livros, de livros que falam alguma coisa de fato.
Esse é livro que inspirou a série Bridgerton na Netflix. A qual vi um capítulo e sai como se estivesse cheirado o pum alheio, e como de de ressaca também. Um capítulo para nunca mais.
Mas tudo bem eu não sou o público disso, pois existe público aqui no Brasil e bem volumoso. Os livros de Julia Quinn já passaram da marca de 10 milhões de exemplares vendidos, sendo mais de 1 milhão no Brasil.
“Julia Quinn é nossa Jane Austen contemporânea.” – Jill Barnett, autora de Tudo por um beijo OWWWW pobre Jane...
“Inteligente e divertido.” – Time Magazine
Eu não vi o mesmo na série apenas recortes de algo pastoso com algumas ideias de alegoria estapafúrdias.
Por que vendeu tanto? Onde as novelas televisivas e seus dramas tiveram mais sucesso no mundo? Isso sempre está vendendo no Brasil algumas leitoras são realmente fanáticas desse gênero, contudo outro punhado de leitores consomem, vivem uma fase apenas e esquecem, são leitoras de hype, de modismos.
9. O Morro dos Ventos Uivantes Emily Brontë Várias Editoras exemplares: 52.942
Ah! Voltamos a respirar oxigênio literário de verdade. Se os livros acima rasos e pretensiosos para falar do amor, da paixão temos aqui de novo para que essa lista não se torne ridícula voltemos a qualidade literária. Ao livro com personagens eternos; profundos, complexos, enigmáticos, assustadores e sobretudo fascinantes. São personagens que se tornam maiores do que a narrativa de que participam. Esse parece ser o caso de Heathcliff e Catherine Earnshaw, de O Morro dos Ventos Uivantes.
Atualmente publicado em uma variedade de edições por selos editoriais distintos, O Morro dos Ventos Uivantes conta a história de Catherine filha de um rico proprietário de terras, o senhor Earnshaw, que um dia tem sua vida cruzada com a do jovem órfão Heathcliff. Os dois se conhecem ainda crianças após o Sr. Earnshaw retornar de uma viagem com um garoto maltrapilho para casa e passar a criar ele como parte da família.
Por que venderam tanto? Acredito que se Emily Bronte escrevesse os livros de jovens adultos eu não teria saído enjoado da sessão na Netflix. Vendem por que são escritos por uma alma rara. Por uma escritora de talento que usa as palavras com sinceridade e respeito à aventura humana e sua complexidade, faz mágica sem colorir com falsos confetes, sem fingir um mundo fascinante ou doloroso, mas revelando-o fascinante e doloroso com linguagem.
10. Admirável Mundo Novo Aldous Leonard Huxley Biblioteca Azul exemplares: 52.489
Aqui está um daqueles livros que a sensação daquela realidade nos visita apenas por mencioná-lo. Assim como O Morro dos Ventos Uivantes nos traz aquela atmosfera inconfundível do drama; Admirável Mundo Novo nos traz o melhor da sensação do universo Sci-Fi. Um mundo único e nem sempre agradável que nos surge como um sonho.
Huxley era humanista e pacifista. Ele cresceu interessado no misticismo filosófico e universalismo, abordando esses temas com obras como A Filosofia Perene (1945) - que ilustra semelhanças entre misticismo ocidental e oriental - e As Portas da Percepção (1954) - que interpreta sua própria experiência psicodélica com mescalina.
No final de sua vida, Huxley foi amplamente reconhecido como um dos principais intelectuais de sua época. Ele foi nomeado para o Prêmio Nobel de Literatura sete vezes e foi eleito Companheiro de Literatura pela Royal Society of Literature em 1962.
Simplesmente nove décadas depois, romance de Huxley ganha nova atualidade, ao alertar que sociedades de controle podem apoiar-se, além da repressão, na tecnologia e culto do “progresso”
São 80 anos da primeira edição brasileira (1941) de Admirável Mundo Novo, grande romance perturbador lançado em 1932.
Diante de tanta “felicidade artificial” em nossos dias, tantas manipulações e tantos condicionamentos contemporâneos, cabe perguntar: seria útil reler Admirável Mundo Novo? Acaso é necessário retomar um livro escrito há nove décadas, numa época tão distante que a Internet não existia e sequer a TV havia sido inventada? Seria este romance algo mais que uma curiosidade sociológica, um best-seller ordinário e efêmero, de que se venderam, em inglês, mais de um milhão de exemplares, já no ano de sua publicação?
Estas questões parecem ainda mais pertinentes porque o gênero a que pertence a obra – ficção científica, distopia, fábula de antecipação, a utopia científico-técnica – possui um grau muito elevado de obsolescência. Nada envelhece mais rápido que o futuro, sobretudo na literatura.
No entanto quem, superando estas reticências, mergulhar nas páginas do romance ficará chocado por sua surpreendente atualidade. Ficará claro que, pelo menos uma vez, o passado capturou o presente. Recordemos que o autor, Aldous Huxley (1894-1963), narra uma história que transcorre num futuro muito distante, próxima ao ano 2500 ou, mais precisamente “no ano 600 da Era Fordiana”, em alusão satírica a Henry Ford (1863-1947), pioneiro norte-americano da indústria automobilística e inventor de um método de organização de trabalho para a fabricação em série e padronização de peças. Tal método, conhecido como “fordismo”, transformou os trabalhadores em algo inferior a autômatos, robôs que repetiam, ao longo da jornada de trabalho, um único gesto. Sua emergência suscitou, à época, críticas violentas: pensemos, por exemplo, nos filmes Metropolis (1926), de Fritz Lang, ou Tempos Modernos (1935), de Charles Chaplin.
Aldous Huxley escreveu Admirável Mundo Novo, visão pessimista do futuro e crítica feroz do culto positivista à ciência, num momento em que as consequências sociais da grande crise de 1929 afetavam em cheio as sociedades ocidentais, e em que a crença no progresso e nos regimes democráticos parecia vacilar.