Há 414 anos era publicada em Madrid a primeira edição do livro que hoje é o mais vendido de todos os tempos com um total aproximado de cerca de 510 milhões de livros vendidos.
Nessa época, tão distante da nossa, Cervantes começava a mudar o rumo da ficção literária junto com outros nomes menores e esquecidos ao longo dos séculos. Don Quixote é importante por ser irônico e inovador em suas alegorias e sutilezas. Hoje temos muito de Dom Quixote em quase tudo que lemos e vemos, e quase não resta dúvidas de que Dom Quixote tenha sido o primeiro romance moderno. Tudo mais veio depois.
Imagine Miguel de Cervantes, que não teve uma vida lá tão mar de rosas, aliás era chamado de o manco de Lepanto, depois de ter a mão esquerda pratica-mente inutilizada na batalha de Lepanto, pois então o imagine ele em sua escriva-ninha, pena à mão, escrevendo seu ino-vador romance, dá pra sentir? É provável que Miguel tivesse grandes am-bições, mas pensar que num Mundo em que pessoas a distâncias de 7.480 km podem se comunicar vendo uma a outra (como foi meu caso essa semana conversando com um amigo em Setúbal, Portugal), seu livro seria o mais vendido e conhecido por quase todo ser humano... Nem em sua mais louca imaginação poderia conceber nada próximo a isso...
Pela grossura do livro de Dom Quixote podemos fazer um cálculo maluco aqui que se colocássemos todos os livros deitados um em cima do outro teríamos uma torre de 35.000 mil km passando em muito da altitude de alguns asteroides que passam próximos a Terra. E se pensarmos em circunferência quase temos uma volta completa na Terra!
capa da primeira edição, 1605
Bem, muito se diz que grandes obras nascem da dor e na literatura, para quem está envolvida nela como leitor ou autor sabe bem disso embora possa não ser uma regra geral, mas é verdade que muitas das obras brilhantes da literatura universal nasceram diante a uma situação não tão favorável ao autor. No caso de Dom Quixote ao menos o esboço do romance foi feito na prisão. Em 1597 o sr. Miguel de Cervantes foi preso, depois que o banco em que depositava todo seu patrimônio quebrou e levou suas economias e seus credores o colocaram na cadeia. Ou seja, será que se o banco não quebrasse teríamos o Dom Quixote? Há uma grande possibilidade de que não.
O encanto de Dom Quixote nasce do descompasso entre o idealismo do protagonista e a realidade na qual ele atua. Cem anos antes, Quixote teria sido um herói a mais nas crônicas ou romances de cavalaria, mas ele havia se enganado de século.
Na história do romance moderno, o papel de Dom Quixote é reconhecido como seminal. A evidência disso pode ser vista em Daniel Defoe, em Henry Fielding, em Tobias Smollett e Laurence Sterne e, também, em personagens criadas por alguns romancistas clássicos do século XIX, como é o caso de Walter Scott, de Charles Dickens, de Gustave Flaubert, de Benito Pérez Galdós, de Herman Melville e de Fiódor Dostoiévski.
Antes de lançar a segunda parte do romance em 1615, muitos acreditam que um fato curioso foi que levou a Cervantes escrever e concluir a história com uma segunda parte. Um autor que usou o pseudônimo de Alonso Fernández de Avellaneda lançou, apenas 1 ano depois, o que seria a continuação da história, o que ficou marcado foi a fraca qualidade literária e isso certamente enfureceu Cervantes.
Em uma sequência particularmente empática no romance vemos o herói e Sancho Panza libertando um grupo de escravos do cativeiro. A sensibilidade especial de Cervantes a esses receptores da cavalaria de Dom Quixote provavelmente decorre de suas próprias experiências em servidão na década de 1570. Cervantes passou cinco anos como escravo em Argel, tentando fugir em mais de uma ocasião.
Bem como viram Dom Quixote é extraordinário em diversos sentidos e uma obra que podemos dizer que irá ser lida ainda por séculos e séculos, e isso tudo começou na penumbra
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