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Blog da Editora Record Ana Lima

Números mostram que o livro impresso irá continuar a vender e a vender muito. As vendas em 2015 fora


Contrariando previsões nefastas, em 2015 foram vendidos mais de 570 milhões de livros nos Estados Unidos, segundo dados da Nielsen Book Scan reportados em artigo do LA Times em 31 de dezembro de 2015. São 17 milhões de livros a mais do que foi vendido no ano anterior, fazendo com que caçadores de tendências e especialistas já apontem uma volta do livro impresso e o fim da disputa entre livros físicos e e-books: acredita-se que conviverão em harmonia e um mercado não retirará leitores do outro; cria-se, na verdade, um novo mercado para os livros digitais e, com isso, o mercado dos livros tradicionais vai se transformando. As edições terão de ser mais caprichadas, as bibliotecas voltarão a abrigar tomos grossos com obras completas e volumes de capa dura? O tempo dirá. Mas algumas tendências já se estabelecem e criam novas oportunidades para editoras pelo mundo.

A literatura YA (Young Adult, termo cunhado para definir os jovens adultos) continua ascendente e, dentro dela, alguns nichos têm se destacado. Em dez anos, de 2002 a 2012, o número de livros do gênero lançado nos Estados Unidos aumentou quase 120% segundo infográfico publicado na NY Mag em novembro de 2012. Curiosamente, 84% destes leitores tinham mais de 18 anos. A situação se repete na Inglaterra e, no painel da Nielsen sobre tendências para o mercado, em 2015, em Nova York, o número ainda girava em torno de 80%. No Brasil, o gênero é o que mais tem espaço para crescer de acordo com relatório da Nielsen Book Scan produzido em meados de 2015.

Alguns megasellers como Harry Potter, Crepúsculo e Hunger Games já justificariam esse boom, mas o fenômeno vai além: se consolidou, os leitores do bruxinho londrino cresceram e outras tendências fortes são notadas ao analisar apenas estes três títulos. Entre elas o crossmidia, frequentemente apontado pela Nielsen como forte tendência do mercado – livros que viram filmes (Harry Potter, Hunger Games, Divergente, A culpa é das estrelas), videogames que viram livros (Assassin’s Creed, Minecraft, World of Warcraft) e filmes (Warcraft, Assassin’s Creed), filmes que viram jogos, etc. Para jovens que passam grande parte do tempo conectados na internet, nada mais natural: saber mais sobre o que ele conhece e gosta parece mais interessante.

O mercado no Brasil dança conforme a música e normalmente acompanha os fenômenos norte-americanos. Entretanto, além do esperado sucesso dos livros que também estouram nas bilheterias, há aqui uma inclinação bastante forte para os livros que expandem o universo de games populares. A franquia de livros inspirada em Assassin’sCreed – Renascença, Irmandade, Cruzada Secreta, Revelações, Renegado, Bandeira Negra, Unity e Submundo (publicados pela Galera Record) –, protagonizada por um assassino que faz parte de uma seita, viaja pelo tempo e enfrenta templários, ultrapassou 1 milhão e 500 mil exemplares vendidos no Brasil em apenas 3 anos, mais que em qualquer outro país, entre eles a Inglaterra e a Alemanha, mercados com vendas expressivas de livros de fantasia. Os números do jogo também não deixam a desejar: são 73 milhões de cópias no mundo.

A chave do sucesso pode estar no número de leitores no país: eram cerca de 71 milhões em 2011, segundo dados do Instituto Pró-Livro para a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, em um universo de 178 milhões de habitantes. Os best-sellers, geralmente, têm como característica chegar ao não leitor – a métrica da pesquisa considera que leitor seria quem leu ao menos 3 livros no período de um ano corrido. No caso dos livros que estendem a experiência do videogame, temos leitores jovens, que também jogam e costumam ser consumidores ávidos destes lançamentos. São lançadores de tendências e têm algo a seu favor: poderão desenvolver o hábito da leitura.

Na pesquisa, o tema é apontado como fator que mais influencia na escolha de um livro para 65% dos leitores. Enquanto isso, videogames são a principal forma de entretenimento dos brasileiros de todas as idades. São 35 milhões de jogadores que passam 40 bilhões de horas em seus consoles ou computadores (dados do Censo Gamer Brasil em 2012 publicados na InsideComm) e que, na hora de escolher um livro na livraria, serão facilmente atraídos para o livro do jogo. Muitas vezes, analisando a repercussão dos livros nas mídias sociais, aquele era o primeiro contato com um romance.

Depois de Assassin’s Creed, outras desenvolvedoras de games trouxeram para o Brasil suas publicações e foram relativamente bem-sucedidas. Até que, em 2015, o fenômeno se repetiu. Livros para um público mais jovem, de até 12 anos, inspirados no jogo fenômeno Minecraft, haviam sido apontados pela Nielsen em um painel em janeiro de 2015 como tendência no mercado; estouraram nos Estados Unidos e depois aqui. O primeiro, Invasão do Mundo da Superfície, foi publicado em abril de 2015 pela Galera Record. Hoje são mais de 11 títulos de ficção juvenil inspirados no universo de Minecraft lançados por 4 editoras diferentes no país e diversos lançamentos programados ao longo de 2016.

Mas os games representam apenas o início das possibilidades do crossmidia no mercado editorial. Como já apontado, os leitores de Harry Potter não são mais crianças, assim como os pequenos que cresceram assistindo a Star Wars na Sessão da Tarde nos anos de 1980. Há um fenômeno ainda mais forte por trás dos games e seu sucesso: a cultura nerd, e ela está intrinsicamente ligada à literatura jovem e seus cases de sucesso.

Há 30 anos ser nerd não era legal. O nerd normalmente era aquele aluno tímido, de óculos, que gostava de ler, de estudar, de Ciências e de Matemática. O que ninguém sabia então era que esses alunos se transformariam em Bill Gates, Steve Jobs, Mark Zuckerberg e outros. Para citar um exemplo da literatura, John Green, autor de A culpa é das estrelas, que se autointitula “nerd fighter”. De repente, ser nerd é legal. Até usar óculos é legal. Os nerds encontraram um lugar ao sol e seus inúmeros interesses são estimulados por pesos pesados da cultura do entretenimento: produções milionárias da Marvel para os cinemas; a volta de Star Wars capitaneada pela Disney; séries de TV protagonizadas por nerds e baseadas em quadrinhos adorados; livros de fantasia, livros com nerds heróis, livros sobre nerds; e até eventos que são verdadeiras celebrações da cultura nerd, onde os mesmos podem se fantasiar sem ser julgados – lá isso é legal, nos dois sentidos –, participar de karaokê em japonês, assistir exclusivamente a minutos de filmes e séries inéditas, ver seus ídolos da TV, dos quadrinhos, do cinema, e por que não, comprar.

A ComicCon de San Diego é o principal evento do gênero, mas pelos Estados Unidos já existem outros, divididos até por nichos da fantasia – quem quiser, pode ir numa convenção só para fãs de dragões, por exemplo. No Brasil, eventos como o Anime Friends e o Brasil Game Show já são tradicionais. A ComicCon Experience, em São Paulo, aconteceu pela segunda vez em 2015 com expectativa de atrair mais de 100 mil pessoas e chamou atenção. Pode parecer pouco frente aos 676 mil visitantes da última Bienal do Livro do Rio de Janeiro, mas é um evento de nicho, focado e com grandes oportunidades para certos gêneros literários.

E como aproveitar plenamente o crescimento da cultura nerd no Brasil? Certamente estar presente nestes eventos de nicho é uma das soluções, mas não a única. Diante da expansão evidente do segmento, livrarias de rede já procuram centrar energias nos livros que agradam a este público – nerd gosta de ler, estão lembrados? –, como exemplo podemos citar a Geek.Etc.Br, da Livraria Cultura, que começou em um cantinho do Conjunto Nacional, na Av. Paulista, mas que em breve será expandida para uma esquina inteira da galeria, ocupando o espaço que pertencia à livraria exclusiva da editora Companhia das Letras. Além de livros e quadrinhos, a Geek vende jogos (não só eletrônicos, mas de tabuleiro também), bonecos, camisetas, miniaturas, dados de RPG, utensílios para casa, almofadas… em comum, o selo nerd ou coisas para pessoas “feitas de maravilha”, como John Green os define _ “nerd fighters: they are just like normal people, but instead of flesh and blood, they are made of awesome”.

O momento nunca foi tão propício para se investir em meios de chegar ao público nerd e dele tirar novos leitores (ou reconquistar antigos). Seja por meio de uma comunicação diferenciada ou de uma linha editorial focada, há oportunidade. A cultura nerd é influenciada e conhecida por adorar clássicos e livros de fantasia, e não raro encontramos livros como As crônicas de Nárnia e O senhor dos anéis entre os mais vendidos; são clássicos da fantasia que venderão sempre. Seu contraponto são, por exemplo, as distopias, que um dia sairão de moda, assim como saíram os livros sobrenaturais de vampiros e anjos. A problemática é identificar quais fenômenos ficarão, quais serão os futuros clássicos dos catálogos. Harry Potter? Guerra dos Tronos?

Chegar neste consumidor pode não parecer mais tão complicado, mas produzir para ele continua sendo um desafio para as editoras. Promessas no cenário internacional podem inspirar produtos 100% nacionais e terem sucesso, como aconteceu com a fanfic de Minecraft assinada pelo YouTuber RezendeEvil, Dois mundos um herói (Seguinte), que seguiu os passos do livro de Mark Cheverton, Invasão do Mundo da Superfície, lançado pela Galera Record. Acompanhar a concorrência e conhecer a fundo o público leitor, suas expectativas e movimentos também ajudarão a direcionar editoras e livrarias.


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